Imagine duas cenas. Na primeira, Dona Maria, moradora de uma periferia, acorda cedo preocupada se terá comida suficiente para os filhos e se o Auxílio vai cair na conta este mês. Na segunda, Dr. João, empresário bem-sucedido, lê o noticiário no seu smartphone de última geração enquanto toma café importado, pronto para mais um dia de reuniões. Quando chegar a hora do voto, Maria e João estarão em lados opostos de prioridades – seus motivadores eleitorais são completamente diferentes. E, no entanto, muitos candidatos e comunicadores políticos insistem em tratá-los como se o comportamento do eleitor brasileiro fosse homogêneo, apostando todas as fichas nas mesmas tendências da moda para atrair atenção.
Da trend à realidade: entre viralizar e se conectar
Nos últimos tempos, basta abrir qualquer rede social para ver a nova febre do momento. Um dia é um filtro de vídeo engraçado, no outro uma dancinha que todo político resolve imitar. Avançamos rápido: logo o meme ganha braços, dança, voa, canta. E assim, num piscar de olhos, o feed vira um oceano saturado de tendências, onde todo mundo surfa na mesma onda — mesmo que não tenha nada a dizer.
É divertido? Às vezes.
É criativo? Pode ser.
É autêntico? Quase nunca.
Esse cenário, antes restrito ao entretenimento, invadiu também a política. Candidatos e equipes de comunicação embarcam nas trends como se isso fosse garantir conexão real com o eleitor. Mas aí vem a pergunta incômoda e crucial:
Você está se conectando com seu eleitor ou apenas tentando viralizar?
Viralizar por si só não elege ninguém. A atenção na política precisa ser qualificada: não basta alcançar milhares de views se essas visualizações não se convertem em confiança e votos. A verdadeira questão que poucos exploram é o que realmente motiva uma pessoa a votar. E a resposta não cabe em um tweet ou vídeo de 15 segundos. Ela está enraizada na vida real de cada um – na classe social, na religião, na percepção de futuro, no bolso, no coração.
Felipe Nunes, diretor da Quaest Pesquisas, observa que o eleitor brasileiro amadureceu; já não se deixa levar apenas por “presentes” do governo ou mensagens vazias. Segundo Nunes, acabou a era da gratidão automática: “70% dos eleitores não têm medo de perder qualquer benefício social independente do governo que estiver em curso”oglobo.globo.com. Em outras palavras, o cidadão entende que programas sociais são obrigação do Estado, não favores a serem pagos com voto. Governar bem e ter boas ações já não garantem aprovação ou reeleição por si sós – é preciso convencer o eleitor de que o projeto de país oferecido é o caminho certooglobo.globo.com. E convencer requer falar a língua dele, tocar nas prioridades dele.
A grande falha de muitas estratégias está em falar sobre o eleitor, mas não com o eleitor. Enquanto alguns políticos estão ocupados demais fazendo a próxima live engraçada, eles deixam de fazer o básico: entender quem é o seu público. Comunicar-se sem conhecer as dores, os medos e os sonhos de quem se quer conquistar é como tentar vender guarda-chuva num dia de sol escaldante. No fim, muito esforço é gasto para ganhar curtidas, e pouco para ganhar votos de verdade.
Então, largue a prancha de surfe das tendências por um momento e olhe em volta. O Brasil é diverso e desigual. Para ser relevante, é preciso reconhecer que as motivações que movem o voto no Brasil variam conforme a classe social. Vamos dissecar essas diferenças a seguir.
Comportamento do Eleitor Brasileiro por Classe Social
Políticos e estrategistas adoram falar em segmentos de eleitorado, mas na prática muitos ignoram a riqueza de contextos que o Brasil apresenta. Classes sociais e voto andam de mãos dadas: o que impulsiona o voto de uma elite financeira não é o mesmo que tira alguém de casa na favela para votar. A seguir, exploramos cada estrato social e seus motivadores eleitorais principais, com exemplos de discursos que resonariam em cada grupo.
Classe A: Ideologia acima de tudo
A Classe A (cerca de 2,9% da população) reúne os brasileiros de alta renda – empresários, executivos e profissionais liberais com renda familiar acima de R$ 28 mil mensais. Vivendo em bolhas de privilégios (condomínios fechados, carros blindados, planos de saúde top de linha), essas pessoas quase não dependem de serviços públicos. Resultado: seu voto tende a ser puramente ideológico.
Aqui, a disputa política é clara e estridente: Lula vs. Bolsonaro, esquerda vs. direita, Estado vs. mercado. Os debates giram muito mais em torno de projetos de país, visões econômicas macro e pautas morais/identitárias do que sobre necessidades concretas do dia a dia. É aquela bolha das redes sociais onde o embate é constante. Talvez você já tenha presenciado (ou participado de) discussões infindáveis ridicularizando o sotaque de um candidato em inglês ou chamando outro de “ex-presidiário” por causa de escândalos passados. Pois é: bem-vindo ao ciclo sem fim da polarização Classe A, um ringue em que quase ninguém convence ninguém e todo mundo já entra com opinião formada.
Como se comunicar com a Classe A? Apelos ideológicos claros e consistentes. Discurso firme sobre visão de mundo. Por exemplo:
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“Chega de Estado inchado e ineficiente. O Brasil precisa de liberdade para empreender e segurança jurídica para crescer.” – Uma mensagem como essa, liberal e anti-Estado, tende a agradar parte da Classe A que preza o mercado livre.
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“Não podemos permitir retrocessos nos valores democráticos e nos direitos individuais. Nossa bandeira é a da liberdade com responsabilidade.” – Outra abordagem, mais ao centro, que reforça princípios gerais caros a quem acompanha política de perto.
Classe B1: Costumes, valores e estabilidade
Logo abaixo da elite, temos a Classe B1 (renda familiar entre R$ 14 mil e R$ 28 mil, aproximadamente 5,1% da população). São pequenos e médios empresários, gerentes, profissionais liberais em ascensão – gente que já tem uma vida confortável, mas ainda não integra o topo da pirâmide.
Os motivadores dessa classe combinam valores tradicionais e estabilidade. Em resumo, aqui costuma pesar muito o discurso de costumes, família e ordem, junto com a defesa da meritocracia. Essas pessoas valorizam aquilo que conquistaram pelo trabalho e temem mudanças bruscas que possam pôr tudo a perder. Segurança (física, econômica e até emocional) é uma palavra de ouro. Mensagens que evoquem nostalgia de “tempos mais simples” ou prometam conservar o que está funcionando costumam ressoar bem.
Como se comunicar com a Classe B1? Apelar para família, segurança e manutenção do que foi conquistado:
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“Aqui, a família é prioridade. Vamos proteger nossos valores e garantir um futuro seguro para nossos filhos.” – Esse tipo de frase, exaltando família e segurança, fala diretamente ao coração desse público mais conservador.
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“Você trabalhou duro para conquistar o que tem. Nosso compromisso é garantir que ninguém tire isso de você.” – Nesta mensagem reforçamos o mérito individual e prometemos estabilidade, ecoando o medo que esse grupo tem de perder o que construiu.
Classe B2: Os serviços na mira
A Classe B2 (renda entre R$ 7 mil e R$ 14 mil, cerca de 16,7% da população) vive uma realidade híbrida. Essas pessoas estão a meio caminho entre a classe média tradicional e as classes populares. Muitos aqui têm um pé no privado e outro no público: conseguem pagar um convênio médico básico, um colégio particular barato pros filhos, mas dependem dos serviços públicos essenciais para todo o resto. É aquela família que faz malabarismo para pagar um plano de saúde simplinho, mas se apertar, acaba no SUS; que tem o filho na faculdade pública, usa transporte público e por aí vai.
Qual é o motivador principal para essa turma? Eficiência nos serviços públicos e qualidade do que é oferecido em troca dos impostos pagos. Eles sentem na pele quando um hospital público lota e não atende, quando a escola do bairro está sem professor, quando o ônibus quebra. Estão atentos à gestão pública: se a máquina não entrega, a indignação vem rápida e o voto muda. Aqui não tem paciência para incompetência administrativa – e há um senso forte de direitos: “eu pago impostos, exijo retorno”.
Como se comunicar com a Classe B2? Reconheça suas contribuições e prometa eficiência:
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“Você paga seus impostos. Tem todo o direito de exigir um hospital que funcione e uma escola que ensine de verdade.” – Essa frase valida o sentimento de injustiça que muitos da Classe B2 têm e mostra alinhamento com sua indignação.
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“A gente vai resolver os problemas do seu dia a dia: o ônibus lotado, o posto de saúde sem médico, a escola sem merenda. Você merece serviço público de qualidade.” – Aqui enumeramos situações concretas do cotidiano dessa classe, sinalizando compromisso em melhorar exatamente onde dói.
Classe C1: Sonhos e estabilidade
A Classe C1 (renda entre R$ 4.236 e R$ 7.060, cerca de 21% da população) é a chamada “nova classe média” que emergiu nas últimas décadas. Muitos compraram seu primeiro carro ou moto recentemente, conquistaram acesso ao crédito, fizeram faculdade (às vezes são os primeiros da família a ter diploma superior). Eles experimentaram a mobilidade social – subiram alguns degraus em relação aos pais – mas vivem agora o temor de descer novamente.
Um motivador central para essa classe é manter as conquistas e realizar sonhos modestos. Porém, nos últimos anos, a estabilidade desses sonhos ficou abalada. Essa turma sente no bolso a alta da inflação: cada compra no supermercado exige cálculo, o botijão de gás pesa no orçamento, a prestação da casa ou do carro sufoca. O custo de vida é uma preocupação diária. O medo da recessão ou do desemprego é constante. Eles já vislumbraram um futuro melhor, mas agora temem escorregar de volta para baixo.
Como se comunicar com a Classe C1? Mostre empatia com a luta para manter as conquistas e foque em poder de compra, emprego e educação:
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“Vamos baixar o preço do gás, da carne e do transporte. Seu dinheiro precisa voltar a valer.” – Mensagem direta ao ponto econômico, promete aliviar o bolso, o que é música para os ouvidos de quem sente a inflação.
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“Quero ver sua filha se formando na faculdade e você com emprego digno para pagar as contas sem aperto.” – Aqui unimos dois sonhos dessa classe: educação para os filhos e estabilidade de emprego/renda para a família. Demonstra que entendemos suas aspirações e angústias.
Classe C2: Dignidade e o medo de perder o pouco que tem
A Classe C2 (renda entre R$ 2.824 e R$ 4.236, aproximadamente 26,4% da população) está no limite entre a classe média baixa e a pobreza. Suas motivações de voto são bem pragmáticas: atender necessidades imediatas e concretas. Estamos falando de gente que se preocupa primeiro com alimentação, aluguel, transporte e renda mínima para sobreviver. Ao mesmo tempo, existe um fator psicológico fortíssimo movendo esse eleitor: o medo de perder o pouco que tem.
Mesmo quem tem pouco teme ficar sem nada. E esse medo molda decisões políticas. Mensagens de terror do tipo “se fulano ganhar, o Bolsa Família acaba” ou “se o outro lado entrar, você vai perder seu emprego” podem colar mais fortemente aqui, porque tocam nesse nervo exposto. Este eleitor vota pensando: “quem vai garantir que minha situação não piore?”.
Como se comunicar com a Classe C2? Tranquilize e ofereça esperança de melhoria incremental, reconhecendo suas conquistas modestas:
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“Quem trabalha duro merece respeito. Vamos proteger o que você conquistou e garantir que você tenha mais.” – Essa frase reconhece o esforço pessoal (mesmo que a conquista seja mínima) e promete tanto proteção quanto avanço.
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“Se a feira tá cara, o salário tem que render. Nosso compromisso é com sua geladeira cheia e contas em dia.” – Aqui mostramos entendimento dos dilemas desse público (dificuldade de comprar comida) e prometemos ação direta para aliviar esse aperto, falando de forma simples e direta.
Classes D e E: Sobrevivência acima de tudo
Por fim, na base da pirâmide, estão as classes D e E (renda familiar até R$ 2.824, cerca de 27,9% da população). Aqui se encontram os brasileiros em situação de vulnerabilidade social, muitos dependentes de programas de governo ou empregos informais e bicos para colocar comida na mesa. Para esse público, a política se resume a uma palavra: sobrevivência.
O voto não é ideológico, nem partidário. Pouco importa sigla ou discurso bonito. A pergunta no dia da eleição é: “Esse candidato vai fazer minha vida melhorar de verdade?” ou, em casos extremos, “Vou conseguir viver se tal pessoa ganhar ou perder?”. É sobre o arroz voltar pra panela, a luz não ser cortada, o filho ter leite amanhã cedo. Dignidade básica.
Programas sociais como Bolsa Família, Auxílio Brasil (ou qualquer nome que tenha) são determinantes. Prometer manter ou ampliar esses programas é praticamente o mínimo para ter a atenção desse eleitor. E vale notar: não adianta prometer mundos e fundos ideológicos, esse público está vacinado contra papo furado. Se a barriga está roncando, não há “corrupção do governo anterior” ou “crescimento do PIB” que convença do contrário.
Como se comunicar com as Classes D/E? Com empatia máxima, linguagem simples e garantia de continuidade/ampliação de suporte:
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“O Auxílio vai continuar. E com mais dignidade, mais respeito e mais oportunidade para você e sua família.” – Essa mensagem toca diretamente na principal preocupação (continuidade do benefício) e adiciona um tom de respeito, importante para quem muitas vezes se sente invisível.
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“Não importa em quem você votou no passado. O que importa é que agora você vai ser prioridade.” – Aqui reconhecemos que esse eleitor já pode ter se frustrado com políticos antes (talvez votou no candidato X e nada mudou). Ao dizer que ele será prioridade “agora”, sinalizamos uma ruptura positiva e a inclusão dele na agenda.
Resumindo: cada classe social carrega suas esperanças e temores específicos, que funcionam como alavancas do voto. Perceba que, do topo à base, há um gradiente: lá em cima prevalece ideologia e visão de mundo; conforme descemos, questões materiais e de sobrevivência dominam. Esse mosaico explica por que campanhas genéricas falham – não existe “eleitor brasileiro médio” quando o assunto é motivação para votar.
Aliás, não é surpresa que num país tão polarizado, a maioria dos eleitores já tenha um lado preferido ou, pelo menos, um lado rejeitado. Pesquisas recentes indicam que apenas cerca de 10% do eleitorado brasileiro está realmente em disputa – são os chamados swing voters, aqueles volúveis ou desencantados que podem mudar de escolhaoglobo.globo.com. Todo o restante tende a votar conforme sua preferência histórica ou sua classe/inserção social. Um exemplo claro é o público evangélico, que vem crescendo e atualmente praticamente não está em disputa para a esquerda: “faça o que fizer, o PT vai perder entre os evangélicos. Esse público não está em disputa” enfatiza Felipe Nunesoglobo.globo.com. Em outras palavras, há segmentos inteiros da população (muitos deles nas classes C2, D e E) cujo filtro religioso e de valores fala mais alto que qualquer proposta econômica. Saber disso ajuda a calibrar expectativas: não dá para ganhar todo mundo. A batalha será pelos desiludidos que ainda podem ser conquistadosoglobo.globo.com – e conquistar esse público exige entender profundamente suas motivações e percepções específicas.
Atenção especial às classes C, D e E: quando o silêncio digital é político
Agora vamos falar bem sério: a maior parte dos estrategistas políticos digitais vive com Wi-Fi de alta velocidade, smartphone top de linha e redes sociais a todo vapor. Mas… e quem vive do outro lado da cidade, sem acesso fácil à internet? É confortável pensar que hoje “todo mundo tá online”, mas essa não é a realidade de milhões de brasileiros. Ignorar isso pode ser fatal em uma campanha.
Nas classes C, D e E, o acesso à internet e ao mundo digital é precário ou inexistente para muitos. Tem gente que só se conecta pelo sinal emprestado do vizinho quando dá. Muita família tem um celular velho compartilhado por três, quatro pessoas. O pacote de dados acaba em dois dias, a tela tá trincada faz um ano, e quando falta dinheiro pro crédito, fim de jogo: ficam offline até o próximo pagamento. Em 2023, segundo o IBGE, 22,4 milhões de brasileiros com 10 anos ou mais não usavam a internet – cerca de 12% da populaçãocnnbrasil.com.br. Não é pouca gente! E não é só questão de conexão disponível; é também falta de condição, de habilidade digital, de letramento tecnológico.
Quer um dado impactante? Uma pesquisa TIC Domicílios revelou que cerca de 76% dos usuários de internet no Brasil já enfrentaram dificuldades em tarefas online simples – como preencher um formulário, enviar um e-mail ou navegar por um site. É como se o mundo digital tivesse portas, mas as chaves estivessem nas mãos erradas. Essa maioria, mesmo quando conectada, não se sente plenamente à vontade no ambiente online. Ou seja, estar online não é sinônimo de saber se informar ou interagir politicamente online.
Enquanto as classes mais altas e instruídas se comunicam por meio de filtros do Instagram, lives no Facebook, threads no Twitter e dancinhas no TikTok, as classes mais baixas ainda vivem a política no boca a boca, no mural da UBS, no panfleto na porta da escola ou da igreja. A “economia da atenção”, para quem mal tem internet, não passa por efeitos especiais nos vídeos, mas sim pela urgência e relevância imediata da mensagem. Importa o básico: “o candidato promete algo que vai melhorar minha vida agora?” Está em jogo saber se o auxílio vai continuar, se o aluguel vai caber no salário, se o ônibus vai passar no horário. É terra de necessidades concretas e imediatas.
Por isso, assumir que “hoje em dia todo mundo está nas redes sociais” é desconhecer o Brasil real. A exclusão digital é uma realidade política: quem não está no Facebook ou WhatsApp também vota, também sente, também decide. E atenção: o silêncio digital dessas pessoas também é político. Se você, candidato ou comunicador, não der um jeito de chegar até elas por outros meios, pode ter certeza que algum adversário vai dar. Seja através do rádio comunitário, do pastor na igreja, do líder local ou do simples corpo a corpo na rua, alguém vai ocupar esse espaço.
Sair da bolha digital dói, dá trabalho, mas é necessário. É como tentar usar 5G onde não tem nem torre de celular – se você insistir na mesma estratégia hi-tech para falar com universos tão diferentes, vai falhar em transmitir a mensagem. Está disposto a sair da bolha e realmente enxergar essas pessoas? Essa talvez seja uma das decisões estratégicas mais importantes de qualquer campanha moderna.
Conclusão: entre ondas virais e âncoras de verdade
Diante de tudo isso, voltemos à reflexão inicial. Quantas vezes você (seja político, assessor ou militante) parou tudo para gravar uma trend porque “todo mundo estava fazendo”? Quantas vezes trocou profundidade por performance, na ânsia de ganhar curtidas rápidas? E quantas vezes se perguntou sinceramente se aquele conteúdo estava alinhado às necessidades de quem realmente precisa de você?
Participar de uma tendência não é um pecado mortal na comunicação política. Faz parte do jogo e pode, sim, gerar engajamento e visibilidade. A questão não é estética, é efetividade. De nada adianta um vídeo bonito se ele não conversa com o eleitor certo. O desafio é usar a linguagem do momento sem perder de vista o propósito e, principalmente, a conexão com o eleitor de carne e osso.
Felipe Nunes apontou que não há evidências de que as fake news (ou quaisquer conteúdos virais) estejam convertendo votos de um lado para outro: “Fake news hoje em dia não mudam a opinião de ninguém; elas só confirmam a informação de quem já pensa de determinada forma”oglobo.globo.com. Ou seja, a batalha digital muitas vezes prega para convertidos, mobiliza mais do que convenceoglobo.globo.com. Isso nos ensina que a comunicação política eficaz não deve depositar todas as fichas em manipular narrativas ou em lacrar nas redes, mas sim em persuadir pelo que é concreto e relevante para o eleitor indeciso (lembrando: apenas uns 10% estão realmente em jogooglobo.globo.com).
Então, que caminhos práticos existem para uma comunicação política mais eficaz? Aqui vão alguns pontos finais, como uma bússola para campanhas que querem navegar nesse mar complexo:
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Segmente a mensagem de acordo com o público: Não trate o eleitorado como um bloco monolítico. Use os insights sobre cada classe social para ajustar o tom e o conteúdo. Aquilo que convence a Classe A entedia ou até ofende a Classe D, e vice-versa. Campanhas eficazes criam pontes de comunicação específicas para cada segmento (sem perder a identidade central, é claro).
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Saia da bolha digital e vá onde o povo está: Para alcançar classes C, D e E, considere meios offline e presenciais. Rediscover rádio, TV aberta, carro de som, panfletagem, conversas nas comunidades, grupos de WhatsApp da vizinhança (que muitas vezes alguém com internet leva a mensagem para os demais). Uma comunicação multicanal, que mistura o digital com o tradicional, garante que sua mensagem chegue aos Marias e Josés sem acesso fácil à internet.
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Foque na percepção econômica e resultados tangíveis: Se a maioria sente que “o país está no rumo errado” em termos de economia, isso vai pautar a eleiçãooglobo.globo.com. Mostre, com fatos e histórias, como suas propostas impactam o bolso e a mesa do eleitor. Retórica vazia sobre crescimento do PIB não cola; mas dizer que o feijão vai ficar mais barato ou que vai ter emprego na cidade pode fazer olhos brilharem. Promessas concretas e cumpríveisgeram credibilidade – e lembre-se, credibilidade é moeda rara.
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Reconstrua a confiança, não espere gratidão cega: Como vimos, acabou o tempo em que bastava distribuir benesses para garantir voto. O eleitor quer se sentir respeitado, ouvido e convencido de que você tem a melhor proposta. Isso significa dialogar, prestar contas e ter humildade para reconhecer erros. Comunicação eficaz é mão dupla – não fale para as pessoas, fale com elas. Ouvir importA tanto quanto falar, especialmente para reconquistar os desiludidos.
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Mantenha uma âncora em valores e propostas sólidas: As ondas vêm e vão. Hoje é meme, amanhã é outra coisa. Mas se você tiver uma mensagem central forte (sua âncora), ela vai manter sua campanha firme mesmo quando a maré das redes mudar. Pode usar memes e trends, sim, mas amarre tudo em algo maior: uma visão, um propósito claramente comunicado e alinhado com o que o eleitor precisa. Em outras palavras, não se perca tentando agradar todo mundo o tempo todo; sustente uma identidade.
No fim das contas, política é sobre pessoas e esperança. As pessoas votam porque, de alguma forma, acreditam. Acreditam que aquele candidato pode melhorar suas vidas, realizar algo em que confiam ou mesmo impedir algo que temem. Para ser lembrado na urna, comece sendo lembrado na vida do eleitor – mostrando que você se importa com o que importa para ele. Isso começa não com mais um vídeo viral, mas com um discurso que acerta o coração de quem vive a realidade brasileira e, apesar de tudo, ainda tem esperança de mudança.
Em um mundo hiperconectado (para alguns) e desconectado (para outros), ganha relevância quem sabe lançar mão tanto da onda quanto da âncora: surfar nas tendências quando fizer sentido, mas ancorar-se no essencial sempre. As ondas são populares, rápidas e passageiras; já a âncora representa seus princípios e compromissos verdadeiros, mantendo você no rumo em meio às tempestades.
Comunicação política eficaz é, portanto, equilíbrio: inovar sem alienar, emocionar sem enganar, segmentar sem rachar o país ainda mais. Se você conseguir contar uma boa história que faça sentido para o público certo – seja Dona Maria, seja Dr. João –, terá dado um passo gigante para ganhar não apenas um voto, mas também a confiança duradoura de um cidadão. E confiança, uma vez conquistada, vale mais que qualquer curtida na timeline.
Em resumo: entre seguir a multidão ou liderá-la, escolha liderar. Seu eleitor – de qualquer classe social – agradece. (Mas não espere gratidão automática… faça por merecer!)